domingo, 27 de junho de 2010

Conhecendo o Inimigo - Parte 2


(27-06-2010)

Dias Passados desde o diagnostico: 11 dias

Os dias anteriores têm sido alucinantes. Há sempre alguma coisa para fazer ou para tratar. Saio cedo de casa e chego a entrar bastante tarde. E, depois o facto de ter estado sem internet durante três dias nao ajudou a actualizar o blog. Mas, passemos ao resumo daquilo que entretanto aconteceu.

No dia a seguir ao diagnostico (quinta - dia 17 de Junho 2010) consegui uma consulta de urgência com uma especialista que o médico do trabalho me tinha imediatamente aconselhado. Portanto, às 8 da manhã já me encontrava no hospital de Cascais para a consulta.

Pode parecer um pouco parvo, mas sentido que era o inicio de uma batalha na minha vida, vasculhei a gaveta das t-shirts e escolhi uma que senti que me iria dar forças durante o dia e que ao mesmo tempo me iria fazer sorrir. Acho que é importante ter coisas à minha volta que nos lembrem que isto é apenas uma dificuldade ultrapassavel tenho de manter a minha cabeça direccionada no prémio: a cura e tudo o que dessa cura vou continuar a conseguir fazer da minha vida.

Portanto, esta foi a t-shirt do primeiro dia de luta. Cada vez que olhava no espelho ela dizia-me: "Estou preparada para a batalha, sem medos! É bom que me temas bichinho"


Gostei muito da médica. Senti que ela tem uma força interior muito grande, senti que seria directa comigo e que nao me iria esconder nada no futuro. Tentou me explicar a minha situação o mais rapidamente que conseguiu (hospital publico têm um limite de tempo para cada doente mas ela arriscou-se e ultrapassou um pouco esse tempo.)
Depois é uma médica que já teve um tumor num outro sitio do corpo o que me faz sentir que ela sabe o que eu estou a sentir. E no final até me deu um abraço, criando uma relação de proximidade.

No resultado da biopsia o que os médica nao gostou foi do tamanho: "47 X 41 X 28 mm" É grande. Isto é um nivel 3. (Podem ver os niveis de estádio do cancro da mama)

A meio da consulta um outro médico entrou e ela disse-lhe: "-Decora a cara desta menina que vais acompanhá-la enquanto eu estiver de férias"
O médico olhou para mim (tenho 32 anos mas pareço mais nova, ainda por cima estava vestida descontraídamente com a tal t-shirt e calças de ganga) e portanto ele respondeu: "- Tenho a certeza que ela não vai precisar de mim para nada."
E depois, quando a médica insistiu e lhe mostrou que nao estava a brincar, só quando ele olhou para a biopsia é que ele se acreditou no que ela lhe dissera.

Resumo do que ela me disse na consulta:

Tamanho do bicho
É muito provavel que este aumento exponencial do tumor ("bicho como eu lhe chamo") tenha ocorrido devido à gravidez. A gravidez altera muito o corpo de uma mulher, as hormonas disparam, e apesar de eu ter feito a apalpação com a médica ginecologista em Janeiro a gravidez veio aumentar algo que já poderia existir no meu corpo com um tamanho tão baixo que ainda nao era perpectivel de se observar pelo toque. Como o meu médico no trabalho dizia "Isto que a Claudia tem demora 20 anos a desenvolver numa pessoa normal", ou seja eu provavelmente iria dar conta disto ao 40 anos que é quando os exames começam a ser obrigatórios para as mulheres fazerem.
"Estragamos o Planeta e depois aparecem estas merdas", disse ela olhando mais uma vez para a biopsia. Gostei de que ela dissesse asneiras, é sinal que não é uma daquelas médicas em que depois de ver tanta porcaria já tudo lhe parece indiferente.
Perguntei-lhe qual era a probabilidade de uma coisa destas aparecer numa grávida.
"Das 5000 a 6000 mulheres que já operei, cerca de 24 descobriram com a gravidez. É uma percentagem muito pequena"
É certo que é uma percentagem pequena, mas pensei "sao 24 mulheres que apanharam o maior susto da sua vida quando a unica coisa que deviam sentir era felicidade de trazerem uma nova vida ao mundo."
E ela acrescentou: "A Claudia abortou em Março. O nosso corpo reconhece quando algo está errado connosco e provavelmente foi por isso que parou com o desenvolvimento do bébé"

A Quimioterapia e a Infertilidade

"Vou-lhe deixar um assunto para ir pensando e analisando: pense se gostaria de congelar ovulos."
A quimioterapia pode causar infertilidade na mulher e menopausa antecipada. Aliás, quando se começa quimioterapia os médicos fazem qualquer coisa para provocar a menopausa a fim de tentar proteger os ovulos. Só que ás vezes isso não é suficiente.
Neste site que encontrei explica o assunto muito bem: "A Fertilidade"
Aqui em Portugal para congelar óvulos só indo a Espanha - também não está assim tão longe! E deixámos a ideia no ar.

Tácticas de Combate ao Bicho

O meu cancro da mama tem cura. É sempre bom de ouvir isso.
As hipoteses que foram colocadas sobre a mesa eram:
* Operação e depois quimio
* Quimio - Operação - Quimio
* Quimio - Operação

A médica marcou uma reuniao com os médicos para discutirem a minha situação na segunda feira de manhã seguinte e aí decidiriam o que fazer.
Como está muito grande provavelmente iria começar por quimio.
Mas vai ser uma batalha de cerca de 6 a 9 meses.
E, como uma amiga minha disse: "É como se estivesses a colocar a tua vida em suspenso durante esse tempo".
Mas ao mesmo tempo outra amiga também disse-me: "Vais sair de todo este processo como se tivesses passado por um renascimento."

As Férias

Tinha férias marcadas desde Abril para dia 29 de Junho. Férias nas Maldivas. Era um presente para mim e para o meu marido por tudo o que passamos durante a gravidez no inicio do ano. Eram férias para assinalar o inicio de recomeçarmos a nossa tentativa de ter um filho.
"Não desmarque essas férias!", disse-me imediatamente a médica, "Se começarmos por quimioterapia, não vai ser por uma semana que isso vai mudar alguma coisa. Vai para as Maldivas e vem com as forças renovadas para combater isto!"
Isto também já me tinha sido dito pela radiologista da CUF e portanto, uma luz de esperança apareceu. Ir de férias para um local de sol e àgua quente, e muito peixinho. Ir de ferias para um sol que não poderei apanhar durante os proximos dois anos a partir do momento que acabarei com o tratamento. Duas médicas a dizerem-me o mesmo era um bom sinal.

Mais Exames

Quando saí da minha consulta o meu pensamento foi: "Durante dois anos não vou poder pensar em engravidar". E aí, pela terceira vez de que este processo todo começou, chorei. Mas desde aí nunca mais tive ter vontade de o fazer. Mas outros exames sao necessários para a decisao de tratamento de quimio e operaçao.

Portanto, a médica passou-me mais exames. E se fosse de férias já todos tinham de estar feitos. Eu já tinha entretanto marcado a ressonancia magnética para dia 25 de Junho na CUF- descobertas com a mesma médica que me fez todos os outros exames (afinal ela é especialista em mamografia, ecografia mamaria, biopsia mamária e ressonancia magnetica... tive muita sorte quando a encontrei). O hospital de Cascais nao tem radiologia (talvez por ser um hospital novo, nao sei) e portanto a médica disse para deixar esse exame como estava marcado na CUF.

Passou-me ecografia à area abdominal (que consegui fazer no proprio dia quando expliquei à senhora da recepcção da ecografia o meu problema e a minha urgencia - porque eu queria que a médica estivesse na posse de todos os exames possiveis na segunda feira de manhã para a tal reunião). A senhora foi tao simpática que mesmo sem haver vagas, ao ver a minha idade e se tratar de cancro da mama ainda me lembro de ela ter virado para mim e dizer: "Aguarde um pouco princesa que já vou tratar de si." É tão bom sentir que Deus tem anjos e todos os lugares!
Cinco minutos depois estava a fazer a eco e outros 5 minutos passados já esta despachada! Estava tudo bem no exame! :)

Outros exames para fazer era Electrocardiograma e o Ecocardiograma. Mais uma vez um outro anjo apareceu na minha vida e consegui fazer ambos os exames no mesmo dia. Ter despachado isso deu-me muita força e energia. Estava tudo bem com estes exames também! :)

Assim, ficou-me apenas a faltar fazer as análises ao sangue uma vez que tinham de ser efectuadas em jejum. Ficou para o dia seguinte.

Á tarde fui á consulta de outro especialista desta vez no Hospital da Luz (devemos sempre ouvir mais do que uma opinião sobre o nosso caso, é importante para sentirmos que vamos tomar a decisao mais acertada). A consulta foi conseguida pela minha ginécologista (que é de lá) e também por uma pessoa que me foi apresentada telefonicamente e que foi tratada por esse mesmo médico.

Ao entrar no Hospital da Luz vieram-me outras memórias. As memórias relacionadas com a gravidez. A lembrança de uma médica nos dizer "O ovulo está cá, mas o coração do embrião parou de bater". Não é fácil. Não é algo com que fiquei traumatizada ou coisa do género, mas é algo que não voltamos a esquecer até ao resto da nossa vida.

O médico foi 5 estrelas. Contei-lhe tudo o que tinha feito de manhã. (não gosto de começar algo com mentiras e omissões). Ele falou-me que o Hospital de Cascais era excelente e que se eu me sentisse bem deveria lá ficar. "É um hospital novo, a Claudia vai lá se sentir tratada como uma princesa. E quando se decidir onde vai ser tratada vai ter de ter confiança na pessoa que cuida de si"
E realmente isso fez-me lembrar o que a senhora da recepção da ecografia me tinha chamado.

Explicou-me que uma pessoa que começa um processo destes pode sempre passar de um hospital publico para um privado, mas que o contrário já não é permitido. Sao regras.

Disse-me para não ir para o IPO (algo que a radiologista da CUF também me tinha dito) - quero realçar que estamos a falar de um médico que também trabalha no IPO.
"Os médicos desta área são todos bons. O IPO está a abarrotar de gente e a Claudia vai-se perder. A Claudia é nova, precisa de atenção especial. No Hospital de Cascais vai ter isso, provavelmente por ser uma das pessoas mais novas que por lá apareceu, no IPO vai ser apenas mais uma."

Depois perguntei-lhe em relação á questão da fertilidade. Mas para ele me falar sobre isso faltavam umas coisas chamadas "receptores hormonais e de cerB2" que a biopsia ia enviar posteriormente. Mas ele explicou-me que os receptores vao vir positivos ou negativos.
Se vierem positivos quer dizer que meu corpo vai receber muito tratamento de quimioterapia e o tumor vai diminuir muito (tenho um presentimento que isto vai vir positivo porque quase de certeza que isto disparou para este tamanho devido às hormonas da gravidez). Mas depois o facto de ser positivo tem o reverso da moeda.
Geralmente, para nos serem tirados ovulos para congelar, injectam-nos com hormonas. Se o meu tumor é receptivo às hormonas significa que pode crescer mais devido a isso. E se entao, esse for o meu caso, nao me aconselhou a retirar os ovulos. A minha saúde está primeiro do que qualquer filho. Sem a minha saúde nao há probabilidade de filhos no futuro. Certo?
Depois também me disse que apesar de o cancro da mama ser um dos cancro com mais estudos, ainda nao existe uma correlação entre cancro da mama e gravidez após cancro da mama. Hoje em dia ainda não é possivel dizer se engravidar depois de um cancro é bom ou mau para a saude da mulher.

Antes de olhar para a biopsia ele disse que o possivel tratamento seria operação e depois quimio. Mas depois de ler o relatório da biopsia (o rui diz que até os olhos dele se abriram mais... acho que ele nao estava à espera de ver um bicho tão grande) reformulou e disse: "Isto deve ser quimio- operação - quimio". Tal como a médica da manhã.

Depois fez-me a apalpação e disse-me que o meu alto no peito, além de nao se notar á vista parecia muito mais pequeno do que aquilo que a biopsia dizia. Parecia-lhe um grau 2 até. wow uma pessoa adora ouvir boas coisas... E eu começei a pensar se o meu tumor nao teria diminuido... aliás o meu marido que tem também me apalpado a mama (mesmo antes de fazer a biopsia) já me tinha dito o mesmo. Ah! Quando fizesse a ressonancia magnética os valores viriam certinhos! E mais pequeninos! (Temos de ter fé)

Falei novamente nas férias e mais um médico me disse "Nao as desmarque, vem de lá com um bronze e muito mais calma que aquilo é o Paraíso! Uma semana não faz diferença!"
Bem... 3 médicos a dizerem o mesmo! Eu e o Rui começamos então a pensar que as probabilidades de Maldivas antes de quimio estavam a aumentar.

Chegamos a casa ás 11 da noite. Eu, estafada como estava, adormeci a fazer reiki a mim mesma. heheeh

Em ambas a consultas de especialista eu disse "Se tirarem a mama resolve o problema já, vamos a isso". Mas nenhum deles quis optar por isso. "As coisas têm de ser analisadas e só depois decidimos."

Como disse a uma amiga minha: "Preciso das minhas pernas, das minhas mãos, dos meus olhos, da minha lingua, dos meu ouvidos... a mama não me faz falta para aquilo que quero fazer na minha vida e hoje em dia depois fazem-me uma nova mama."

2 comentários:

  1. É revigorante ler estes posts. Consegues ser tão positiva, que chego a pensar que eu sou demasiado pessimista com tudo.
    Muita força!

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  2. LOL Temos de dar (ou tentar dar) um lado positivo às coisas. Antes de ir para as Maldivas estava a fazer a depilação (coisa que detesto) e tinha contado á esteticista que conheço há anos que tinha cancro. A meio da conversa sai-me algo do género: "Bem, tentado ver algo positivo nisto tudo... se me cair o cabelo já nao vou ter de fazer depilação nas pernas por muito tempo!" hehehe
    Ela ficou a olhar para mim a pensar como é que eu poderia brincar com coisas dessas... mas além de ser verdade o que disse, uma pessoa tem sempre de tentar ver o lado positivo da coisa... LOL

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